Rio: milícia oferece "pacote" de eleitores a políticos Terra

Os agentes paramilitares da milícia na favela do Batan, zona oeste do Rio de Janeiro, oferecem um "pacote" de eleitores da região que "administram" a vários políticos e levam os votos a quem oferecer mais dinheiro. Essa informação é de uma equipe do jornal O Dia, que morou na favela por duas semanas e foi seqüestrada e torturada após ser descoberta pelos criminosos.

Os milicianos recrutaram moradores para fazer o censo. A repórter de O Dia foi uma das inscritas. Eles querem saber quem é eleitor, quantos são e o número do título para apresentar aos políticos interessados. Quem comprar o "apoio" leva a certeza de que nenhum outro candidato vai colocar seus pés na favela e muito menos esticar faixas ou pregar galhardetes nos postes.
O processo eleitoral nas favelas Rio das Pedras e Gardênia Azul também é organizado desta forma. Elas já "elegeram" quem pode entrar nos bairros. Na eleição passada de 2004, Rio das Pedras só permitiu a divulgação de duas campanhas políticas na favela.
A milícia que domina a Favela do Batan faz planos de ver o censo apontar que o local tem 50 mil pessoas. Alguns nomes de políticos da zona oeste já são cogitados como possíveis interessados em fechar a "parceria" com os milicianos.Um deles mantém um cabo eleitoral no bairro. É o que garante Betão, um homem que fez um churrasco na favela no dia 6 de maio para os moradores e se apresentou como assessor de um deputado estadual.
"Este ano nós não vamos deixar todos os candidatos entrarem para pedir voto, não. Vai ser um só. Vamos fazer um censo na comunidade para saber o número de pessoas em cada casa, quem trabalha e quanto ganha cada morador", afirmou um integrante da milícia à equipe de O Dia, que foi até a Associação de Moradores do Batan e se cadastrou para trabalhar no censo.
Os milicianos explicaram que 20 pessoas realizam o trabalho. Quando a inscrição começou, 14 moradores assinavam a lista de "emprego". A promessa era de que cada um dos recenseadores receberia uma cesta básica e R$ 10 por semana. A cesta distribuída pela associação, contaram alguns moradores, seria fruto do desvio de benefício dado às escolas da região para ajudar a população mais pobre.
A dinâmica da favela dominada pela milícia foi vivenciada por equipe de O Dia do dia 30 de abril ao dia 15 de maio. Um panfleto distribuído aos moradores anunciando que o grupo assumia o controle do bairro mostra que a imagem de uma águia é a marca da milícia na região.

Invasão

A regra ditada pela milícia da favela do Batan diz que toda locação de imóvel deve ser precedida de análise rigorosa do morador interessado pela associação. O principal temor da milícia é a invasão da favela pela ADA, facção que dominava o local.
O "prefeito" local seria um homem que só anda de touca ninja na favela. Conhecido como "01", ele revezaria carros em seus "policiamentos". Ele está jurado de morte pela ADA.
Os criminosos se organizam em turnos para distribuir a função de acordo com o trabalho do policial. Os milicianos fardados formam o primeiro escalão do grupo criminoso, mas recrutam moradores para atuar como sentinelas na proteção de áreas que consideram vulneráveis. Os milicianos pretendem instalar cancelas e portões nas vias de entrada da área.
"Eu era catador de papel. Vocês me vêem todo ferrado assim de dia, mas de noite só dá eu no morro, com a 12 na mão", afirmou um homem de aproximadamente 50 anos. O miliciano de segundo escalão estava preocupado, pois não conseguia cumprir as ordens dos superiores. "Acho que vou à Quinta da Boa Vista pegar grama. Se eu arrancar mato e plantar lá, quando crescer vou sentir o peso da Madalena", disse, referindo-se ao caibro utilizado como instrumento de tortura.
O homem conta que a grama seria colocada em volta do campo de futebol da casa usada como Quartel General da milícia, na Rua Pedro Nava. Outros três o acompanhavam e também eram forçados a trabalhar para o grupo criminoso.
Os trabalhos forçados são rotina na favela. Na maioria dos casos, são direcionados a supostos viciados em drogas, obrigados a reformar casas dos milicianos e capinar. "Quem falou que o tempo da escravidão acabou? Aqui não teve 13 de maio, não", ironizou o miliciano de segundo escalão.

PAC paralelo

A favela do Batan é em sua maior parte plana. O morro é a grande preocupação da milícia. A geografia e a miséria da área são agravantes, porque tornam o local propício a nova invasão do tráfico.As pessoas que vivem no morro são muito pobres, mas a milícia obriga os moradores que têm barracos de madeira a erguerem casas de alvenaria. Alguns já abandonaram os barracos, pois não têm condições de construir. A milícia também importou para o Batan a estética higienista da zona sul.
Quem descumpre a ordem de não colocar lixo na rua fora dos dias de coleta é punido. O resultado são ruas limpas durante toda a semana.
Moradores da favela contam que há um trecho do Campo de Gericinó usado como cemitério do tráfico. Algumas senhoras falaram que não gostam de fazer caminhada por lá para não pisarem nas covas clandestinas. A presença de corpos não identificados na favela é uma rotina da população.
Um homem contou que seu vizinho invadiu um terreno e comprou material de construção para fazer uma casa. Durante as escavações para fazer a base da construção, encontrou um braço humano e desistiu de construir a casa no local.

O Dia
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