Vozes da classe média

De acordo, com o programa “Vozes da classe média”, os limites para fazer parte desse novo recorte de “classe” são os seguintes: de R$ 291 a R$1.091 como renda mensal familiar per capita. Dessa forma, as conclusões são uma maravilha! Mais de 50% da população brasileira estão nesse perfil – um total superior a 100 milhões de pessoas. Então, vamos lá verificar – na realidade concreta da vida real – quem está enquadrado dentro dessa inovadora definição de “nova classe média” e quem já está recebendo uma renda tão elevada que está até acima desse nível, passa a fazer parte das elites, da classe alta.
Consideremos o caso de um jovem casal, sem filhos. Um dos cônjuges recebe um salário mínimo e o outro está desempregado. Sua renda mensal é de R$ 620, o que nos permite concluir uma renda per capita de R$ 310 a cada 30 dias. Imaginemos ainda que seus vizinhos sejam um casal com 2 filhos, onde os pais trabalham e recebem cada um deles salário mínimo também. A renda mensal da família é de R$ 1.240, com uma renda per capita de R$ 310, como no caso anterior. Vejam que ambas as famílias são integrantes da “nova classe média”, pois estão acima do patamar mínimo de R$ 291, o que lhes permitiria a chave de acesso ao paraíso do consumo, segundo as capas das revistas semanais penduradas nas bancas de jornal. Pouco se fala a respeito da qualidade dos serviços públicos que recebem, como saúde, educação, saneamento, transporte público, etc. O que importa é a renda auferida.
Cabe ao leitor optar: o estabelecimento arbitrário desses valores seria ato de ingenuidade ou de maldade? Afinal, não é lá muito difícil contabilizar os níveis de despesa mensal dessas unidades familiares: o transporte coletivo numa grande cidade; o aluguel de moradia em péssimas condições; as contas de água, luz e telefone celular; o gás para cozinha; as compras de cesta básica e seus complementos; etc. Ora, o retrato é de uma sobrevivência nesse nível básico, que não permite quase nenhuma capacidade de poupança, nem o usufruto das boas condições de vida. Quem teria a coragem de afirmar que esses indivíduos seriam integrantes da “nova classe média”? Em sentido oposto, Pochmann nos oferece uma interessante reflexão a respeito do fenômeno, na apresentação de seu livro:
- O adicional de ocupados na base da pirâmide social reforçou o contingente da classe trabalhadora, equivocadamente identificada como uma nova classe média. Talvez não seja bem um mero equívoco conceitual, mas expressão da disputa que se instala em torno da concepção e condução das políticas públicas atuais.
Por outro lado, tão ou mais impressionantes são as conseqüências da definição casuística do limite superior para o enquadramento em “nova classe média”. Imaginemos outra vez a situação de um casal típico de assalariados, com um filho. Ele acabou de conseguir um emprego numa empresa automobilística no ABC e recebe o piso da categoria. Ela é empregada de um banco e também recebe o piso salarial assegurado pelos acordos dos sindicatos com a FENABAN. A renda mensal do trio familiar supera R$ 3.300, com um equivalente per capita superior aos R$ 1.091 do programa oficial do governo. Dessa forma, a conclusão é assustadora: pasmem, mas essa família de trabalhadores não seria mais integrante da “nova classe média”. Em função dessa “estupenda” remuneração mensal, eles já teriam sido alçados à condição da elite, fazem parte das classes altas da sociedade brasileira! Uma loucura, para dizer o mínimo!

http://correiodobrasil.com.br/quais-sao-essas-vozes-da-nova-classe-media/521213/#.UG2uy01X15J

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